A
dois cigarros de finalmente entender o que havia dado de errado entre Catarina
e ele, decidiu parar de fumar. A vida de dúvidas era mais fácil e enquanto
fumava a morte tornava-se mais certa. Bebeu mais um gole de uísque e pôs-se a
ruborizar.
Dois
dedos de sua mão direita massageavam sua têmpora e sua mão esquerda levava o
copo. Mais poucos passos e atravessaria o corredor estreito e longo de carpete
vermelho com detalhes de dourado, aparador de madeira com abajur de madeira
escura e luz quente, quadro de avó que nunca conhecera e portas de quarto que
nunca abrira. Mais alguns poucos passos e chegaria à poltrona na qual pegaria
no sono até a manhã seguinte, quando seria acompanhado por dores de cabeça,
velhas amigas.
Chegara
ao sofá café de couro e decidira pausar por lá. Catarina nunca fora complicada,
pensara. Não fora complexa, não dava trabalho, entendia meus erros, conhecia
meus vícios e perdoava meus pecados. Foi perfeita, Catarina. Foi, não deixou de
ser mesmo ao me abandonar.
O
silêncio era a casa. Todo o resto rugia e quebrava como ondas, como revolta,
como mar. Dmitri era fã de touradas e morria por elas. Sempre soube que nem
todas as noites eram do toureiro. Torcia pelas noites do touro. Agora que a
noite chegou, não sabia se poderia aguentá-la.
Com
esforço arrastou-se pelo sofá até chegar a seu braço, derramando goles pelo
tapete azul cruzou o caminho entre o sofá e a poltrona engatinhando, protegendo-se
dos perigos que zuniam na zona de guerra que era o campo de memórias que nutria
no cômodo.
Mais
uma vez bêbado. Era um bêbado, Dmitri. Catarina soube e Dmitri soube disso.
Agora sentado na poltrona café de couro, bebeu o resto de seu uísque e
descansou o copo ao chão, quebrando-o com a queda. Alcançou um cigarro de seu
maço e acendeu-o. Estava a um cigarro de entender o que havia de errado com
ele.
E
adormeceu. O cigarro se desfazia entre seus dedos até queimá-los, acordando-o.
Bêbado, tomou a decisão que nunca fora capaz de tomar enquanto sóbrio. Morto,
tomou a decisão que não tomara enquanto vivo.
Tirou
o maço de cigarros do bolso da camisa para dar mais espaço ao coração.
E
morreu.
Até
a manhã seguinte, quando viveu ao acordar. Viveu o luto de sua própria morte
até morrer novamente na noite seguinte. E assim tem feito desde que Catarina se
foi.
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