terça-feira, 19 de abril de 2016

Caco

   Uma noite como outra qualquer, daquelas nas quais se bebe um copo de uísque e entre um piscar e outro mais longos se nota um ou outro alguém que passa pela escura e cinza rua, cujas árvores se expressam opacas em gradiente do cinza ao verde. Os postes não iluminam mais que a lua, com suas luzes âmbar quase nuas em seus brilhos quase turvos, frágeis como os olhos aguados da mulher aos prantos no iphone capa branca, lábios róseos e unhas roídas. Uma entre várias, infinitas. Várias cadeiras vazias, iguais, singulares em plural, dando vezes a ocupadas tão logo as ruas cheias dão espaço às vazias.    
   Poças dão vez às gotas que não tão poucas se formam rios – as ruas sujas desaparecem conforme o ar se torna frio – e os bares enchem seguindo os copos que pouco a pouco se esvaziam.
   
   A moça loira de rosto inchado e olhos vermelhos olhou pro lado e viu um espelho no vidro do carro – tão logo pôde se distraiu: um copo a mais de uísque, por favor.

   Nem os copos são únicos.
   Nem ruas, nem chuvas, nem brilhos quase turvos de postes de linhas duras em cenários tristes, escuros.
   Quando os copos caem, tornam-se singulares e plurais – todo caco é copo.
   Pessoas também.